No dia 29 de julho de 2023, foi apresentado ao Brasil o texto do Substitutivo à Proposta de Emenda à Constituição número 45, de 2019 (PEC 45-A/2019).

A PEC 45-A/2019 foi convertida na Emenda Constitucional 132, de 20 de dezembro de 2023, publicada no Diário Oficial da União de 21 de dezembro de 2023. 

A Emenda Constitucional 132/2023 reformou o Sistema Tributário Brasileiro para introduzir no Brasil a tributação sobre o valor agregado, segundo o modelo europeu.

O objetivo declarado é fomentar o crescimento econômico do país, através dos princípios da simplicidade, da transparência, da justiça tributária, da cooperação e da defesa do meio ambiente.

A transferência da tributação para o consumo, a uniformização da legislação e as restrições a incentivos fiscais prometem extinguir a guerra fiscal entre Estados, tolerada pela Constituição de 1988.

Danos ao meio ambiente e os prejuízos à saúde humana também passarão a nortear a incidência tributária.

A tributação, até então restrita aos bens e serviços materiais, será ampliada para alcançar bens imateriais e direitos.

A não cumulatividade promete amenizar o aumento do ônus tributário, mas a burocracia dela resultante demandará a aplicação de Inteligência Artificial.

A mudança exigirá um período de adaptação que se iniciará em 2026 e terminará em 2033.

A reforma tributária não está restrita ao texto da EC 132/2023, mas exigirá a edição de leis para regulamentar os novos tributos e alterar outros, de forma a adequar o Sistema Tributário Nacional às novas diretrizes.

Por enquanto, a única base legal deste texto, é a própria EC 132/2023. 

Ao todo, a EC 132/2023 possui 23 artigos, que trazem inúmeras alterações ao texto da Constituição Federal de 1988.

Veja do que trata cada artigo:

ArtigosVigênciaConteúdo
21/12/2023Modifica 19 artigos constitucionais e acrescenta mais 5, estabelecendo as bases da reforma tributária.
21/12/2023Modifica o Ato das Disposições Transitórias vinculados ao Sistema Tributário Nacional, mediante alteração em 4 artigos e adição de mais 14.
01/01/2027Altera 7 artigos da Constituição Federal
4º 01/01/2033Altera 8 artigos da Constituição federal
01/01/2033Altera 2 artigos das Disposições Constitucionais Transitórias
21/12/2023Trata da transição do ICMS e do ISS para o IBS enquanto inexistir lei complementar regulamentadora
21/12/2023Trata da compensação de perdas na arrecadação, a partir de 2027, com o IPI
21/12/2023Cria a Cesta Básica Nacional de Alimentos
21/12/2023Permite à lei complementar regulamentadora do IBS e da CBS instituir regimes diferenciados de tributação para alguns setores econômicos, prevendo redução de 60% das alíquotas.
1021/12/2023Estabelece conceitos para fins de incidência do IBS e da CBS em regime diferenciados de tributação.
1101/01/2027Dispõe que a extinção das atuais contribuições sociais sobre a receita e o faturamento (PIS e COFINS) não abrange a Contribuição Previdência sobre a Receita Bruta – CPRB.
1221/12/2023Institui o Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais ou Financeiros do ICMS, para compensar, com recursos da União, as pessoas jurídicas atualmente beneficiárias de isenções, incentivos e benefícios fiscais ou financeiros
1321/12/2023Fixa os valores dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional, destinado a reduzir as desigualdades regionais e sociais, pagos pela União aos Estados e ao Distrito Federal
1421/12/2023Determina à União o custeio do Comitê Gestor do IBS
1521/12/2023Estabelece que os recursos dos Fundos de Compensação de Benefícios Fiscais ou Financeiros e de Nacional de Desenvolvimento Regional, bem como   as compensações por perdas decorrentes da substituição do IPI pelo Imposto Seletivo, não são incluídos em regimes fiscais para estabilidade macroeconômica e crescimento socioeconômico.
16 e 1721/12/2023Alteram a competência sobre o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCD, inclusive na abertura de sucessões. 
1821/12/2023Determina ao Poder Executivo o encaminhamento, ao Congresso Nacional, de projetos de leis para regulamentar a reforma tributária.
1921/12/2023Estabelece sobre o crédito presumido da CBS para projetos beneficiados com incentivos de desenvolvimento regional
2021/12/2023Estabelece sobre a transição do PIS/PASEP
2121/12/2023Estabelece sobre a regulamentação dos impactos da reforma tributária sobre os contratos vigentes
2221/12/2023Revoga dispositivos constitucionais
2321/12/2023Estabelece sobre a vigência da EC 132/2023

IBS e CBS

Lei Complementar instituirá dois tributos sobre o consumo:

  • Contribuição sobre Bens e Serviços – CBS, de competência da União, para substituir o PIS e a COFINS;
  • Imposto sobre Bens e Serviços – IBS, de competência conjunta dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e sob a administração de um Conselho Nacional, para substituir o ICMS e o ISS.  

Com algumas exceções, esses tributos incidirão sobre todas as operações com bens materiais ou imateriais e serviços, inclusive direitos autorais, ampliando enormemente o campo da incidência tributária.

Apesar de estar prevista uma legislação única, aplicável em todo o território nacional, o IBS será gerido por um Comitê Gestor, composto por representantes das Administrações Tributárias de cada ente federativo, com poderes de regulamentação alheios ao Legislativo.  

A CBS e o IBS serão tributos não cumulativos e incidirão no destino dos bens e serviços, inclusive na importação.

O tributo não cumulativo gera um crédito a cada aquisição que é compensado com o débito da venda ou da prestação. 

Ou seja, nas operações no campo de incidência do IBS e da CBS, será necessário determinar o crédito e o débito, para identificar o valor a pagar ou o saldo a creditar-se.

Cada item adquirido deve ser analisado sob o ponto de vista de apropriação de créditos.  

Certamente, o contribuinte será obrigado a pagar por tecnologias e profissionais especializados, se não quiser ter problemas na apuração dos tributos devidos.

Cada ente federativo (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) fixará a própria alíquota da CBS e do IBS, sob pena de adotar a alíquota referenciada pelo Senado Federal.

Sendo a tributação realizada no destino e considerando os 27 Estados e cerca de 5.700 Municípios, é provável que sejam inúmeras as alíquotas do IBS, comprometendo a simplicidade prometida pela Emenda Constitucional.

No período de transição, o IBS e a CBS serão cobrados às seguintes alíquotas:

 IBSCBS
Em 20260,1%0,9%
Em 2027 e 20280,05% para o Estado e 0,05% para o Município0,1%
A partir de 2029Fixadas pelo Ente Federativo

Alguns produtos e serviços terão isenção ou redução de alíquotas.

No entanto, os prestadores de serviços, que dependem, essencialmente, da contratação de mão de obra, serão os mais prejudicados em função da baixa probabilidade de apropriação de créditos do IBS e da CBS. 

Imposto Seletivo

O Imposto Seletivo promete tributar a produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.

Esse tributo poderá ter os mesmos fatos geradores e bases de cálculos de outros, concretizando a bitributação. A alíquota a ser aplicada ainda é uma incógnita.

Além disso, não se sabe o que será determinado como prejudicial à saúde ou ao meio ambiente. Esse conceito pode abranger qualquer tipo de produto ou serviço:

  •  O uso de água, do solo e de produtos químicos para cultivo de alimentos;
  • Refrigerantes, cervejas e bebidas alcóolicas, pois fazem mal à saúde;
  • Carvão utilizado para os churrascos do fim de semana, pois árvores precisam ser cortadas;
  • Combustíveis utilizados pelos caminhões para transportar alimentos;
  • Serviços hospitalares que utilizam medicamentos químicos e descartam produtos perigosos;
  • Produtos químicos utilizados por salões de beleza;
  • Medicamentos fabricados com produtos extraídos da natureza;
  • Água que abastece as torneiras das residências, dentre outros.

Um simples passeio de final de semana pode custar muito mais, por conta da incidência do Imposto Seletivo. O que dizer de todos os outros produtos com potencial de prejuízo ao meio ambiente e à saúde?

Será esse o ônus que todos devem pagar para que as empresas, principalmente a indústria, compensem os créditos dos novos tributos não cumulativos? 

Extinção de Tributos

Serão extintos os seguintes tributos:

  • A partir de 2027:  Contribuições sociais sobre a receita, o faturamento e a importação (PIS e COFINS);
  • A partir de 2033:
    •  Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços de Comunicações e de Transportes Interestaduais e Intermunicipais – ICMS, de competência dos Estados e do Distrito Federal;
    •  Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS, de competência do Distrito Federal e dos Municípios.  

Em 2026, o PIS/PASEP e a COFINS continuarão a ser cobrados normalmente, concomitantemente com a CBS – Contribuição sobre Bens e Serviços.

O ICMS e o ISS incidirão normalmente até 2028. De 2029 até 2032, as alíquotas fixadas pelos Estados, Distrito Federal e Municípios serão cobradas às seguintes proporções:

20299/10
20308/10
20317/10
20326/10

No período de transição, haverá incidência simultânea do ICMS, do ISS e do IBS. 

A extinção do ICMS, do PIS e da COFINS é justificada pela complexidade da apuração e pela quantidade infinita de normas e regulamentos. 

Segundo os legisladores, a regulamentação uniforme prevista na EC 132/2023, evitará que cada ente federativo edite norma própria para cobrança do IBS e da CBS.

Vale lembrar, no entanto, que o PIS e a COFINS, tributos federais, regidos pela mesma legislação, trouxeram graves problemas aos contribuintes quando da não cumulatividade.

Aumento de alíquotas foi necessário para compensar a perda de arrecadação pela dedução de créditos, antes restritos às aquisições de produtos e serviços vinculados ao objeto empresarial.

Isso sem contar o aumento da burocracia para controlar e informar os créditos tributários ao agente arrecadador.

Por anos, os contribuintes questionaram judicialmente a não cumulatividade do PIS e da COFINS, enquanto o Fisco ajustava a legislação para impedir perdas na arrecadação. O mesmo se deu com o ICMS desde a sua criação.

O cenário parece que se repetirá, o que não contribuirá em nada para a simplificação e a desoneração anunciadas.   

Imposto sobre a Produção Industrial – IPI

O texto original da PEC 45/2019 previa a extinção do Imposto sobre a Produção Industrial – IPI, a partir da incidência do Imposto Seletivo.

No entanto, na conversão da EC  132/2023, o legislador preferiu manter o IPI, mas incidindo à alíquota zero. 

O IPI continuará sendo cobrado sobre os produtos industrializados na Zona Franca de Manaus e nas Áreas de Livre Comércio, para não alterar o regime atual. Nesse caso, o IPI não poderá incidir cumulativamente com o Imposto Seletivo.

Vale lembrar que o IPI, é, por natureza, um imposto seletivo, mas em função da essencialidade do produto. Não tributa ou incide à alíquota zero sobre grande parte dos produtos alimentícios, de higiene pessoal, insumos minerais e minérios, gás de cozinha, insumos utilizados na fabricação de produtos de limpeza e medicamentos, dentre outros produtos essenciais.  

A substituição da seletividade essencial pela seletividade ambiental ou sanitária mudará para sempre o modelo econômico do país! O potencial restritivo dos atuais principios constitucionais poderá até nos conduzir de volta à idade da pedra!  

Alterações no IPVA

Será ampliada a base de incidência do Imposto sobre a Propriedade Veículos Automotores – IPVA.

O imposto abrangerá a propriedade de veículos automotores terrestres, aquáticos e aéreos, com algumas exceções.

Poderá ter alíquotas diferenciadas do IPVA, variáveis em função do tipo, do valor, da utilização e do impacto ambiental provocado pela propriedade. 

Ou seja, além de cobrar o tributo em função do desgaste das rodovias terrestres provocado pelo veículo automotor, o legislador agora deseja a compensação pela poluição da água e do ar causada pelos veículos aquáticos e aéreos. 

Estados e Distrito Federal terão assim, autonomia para tributar danos ao meio ambiente, com base no novo princípio constitucional.  

Alterações no IPTU

A base de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana – IPTU poderá ser atualizada diretamente por ato do Chefe do Poder Executivo Municipal, sem interferência do Poder Legislativo.

Cabe lembrar que a Súmula 160 do STJ decidiu que a atualização do valor venal do imóvel depende de lei.

Com a EC 132/2023, o judiciário deve manifestar-se novamente. No entanto, o certo é que ao contribuinte caberá pagar a conta. 

Mudanças no ITCMD

No caso do Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doações – ITCMD, a principal modificação é a progressividade em função do valor do quinhão, do legado ou da doação.

Isso significa que quanto maior o valor dos bens destinados aos beneficiados, maior será o valor do imposto a pagar.

Caberá ao Estado, portanto, boa parte da herança deixada pelo falecido, em detrimento do herdeiro. 

Contribuição Estadual 

Os Estados e o Distrito Federal, que em 30/04/2023, possuíam Fundos de Investimentos em obras de infraestrutura e habitação, financiados por contribuições compensatórias de regimes especiais, poderão instituir contribuição sobre produtos primários e semielaborados, com a mesma destinação.

Essa contribuição será cobrada até 31 de dezembro de 2043.

Cash Back

Após garantir a sua parte na renda, no consumo, na herança e nos bens do contribuinte, a EC 132/2023 criou o mecanismo de cash back.

O cash back é a devolução de uma pequena parte dos tributos para o contribuinte de baixa renda, com a finalidade de redução da desigualdade.

Para obter tal benefício (?), o contribuinte será obrigado a informar o número do seu CPF em cada produto ou serviço que consumir?

Certamente, o Fisco terá acesso às informações econômicas do contribuinte para enquadrá-lo como de baixa renda.

Como administrar essa questão com os tributos estaduais e municipais, já que informações dessa natureza são centralizadas na União? 

Conclusão

Em resumo, a reforma tributária instituída pela EC 132/2023 parece ter como principal objetivo reforçar o caixa dos agentes arrecadadores de tributos.

Afinal, onde estão a simplificação e a desoneração prometidas ao contribuinte?

Novos tributos complexos substituem outros de igual natureza, com ampliação da base tributária (e o que dizer das alíquotas ainda desconhecidas?).

Tributos antigos têm suas bases e campos de incidência ampliados.

E mais de 80 tributos ainda serão cobrados paralelamente.

Além disso, longo período de transição demandará infinitas horas de trabalho e recursos materiais e judiciais.

Serão as leis regulamentadoras capazes de desenrolar esse novelo?

Ou seria melhor simplesmente alterar os tributos atuais?

Aguardando as próximas etapas.

Veja também os efeitos da reforma tributária no SIMPLES NACIONAL.

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